sábado, 21 de abril de 2018

Leandro, rei da Helíria




Foi ontem que fui com os meus alunos do 7.º ano ao teatro. Eles adoraram a representação e reconheceram desde logo as personagens. No fim, disseram que faltavam algumas partes, que o texto da Alice Vieira era mais completo. Fiquei contente: afinal, sabiam bem o que tinha sido eliminado desta representação, sinal de que estiveram atentos ao estudo da obra. Concluíram, por fim, que se a peça fosse representada integralmente, duraria muitas horas e as pessoas achá-la-iam "um pouco secante". 













LEANDRO, REI DA HELÍRIA

de Alice Vieira
Tudo se passou no reino de Helíria, há muitos, muitos anos. Leandro, rei de Helíria, teve um sonho muito estranho, mesmo muito estranho!  Segundo ele, este sonho era um “recado dos Deuses”! Estes queriam que Leandro deixasse de reinar.
O rei tinha três filhas – Amarílis, Hortênsia e Violeta – e resolveu entregar o reino à filha que demonstrasse ter maior amor por ele.
«Quero-vos como a comida quer ao sal», foi assim que definiu a princesa Violeta o seu amor pelo pai. Leandro, não percebendo o significado das palavras da filha, acabou por tomar a pior das decisões... 
Vem, mais tarde, a arrepender-se, percebendo que Violeta seria a única merecedora da sua generosidade.

Vitima do próprio orgulho e castigado pela sua cegueira, o rei expia as culpas mergulhando na miséria, ainda que sempre acompanhado pelo seu fiel bobo.

Por fim, passados anos, reencontra Violeta que lhe demonstra com um banquete “especial”, o verdadeiro significado das palavras usadas no passado.

Uma bela história de tradição popular, com um enredo em muitos aspectos semelhantes ao de “Rei Lear” de Shakespeare. Uma história onde se fala de amor, de ingratidão, de sonhos, de remorsos, de longas viagens, de aprendizagem e de muito mais…





Resumo do texto dramático



Um rei bondoso, duas filhas más, uma filha boa e um bobo fiel. É assim o reino de Helíria! Tudo está em paz até ao dia em que o Rei tem um sonho muito estranho, que o leva a crer que está na altura de abandonar o trono. Como não tem filho varão decide entregar o reino à filha que mais o amar. Para isso, cada uma deve exprimir, por palavras, os seus sentimentos. Amarílis e Hortênsia fazem um lindo discurso comparando o seu amor ao Sol, ao ar e a todos os elementos vitais. Viloleta, a filha mais nova, não encontra outra comparação senão a de que quer ao pai tanto como a comida quer ao sal. O Rei não entende esta medida de amor e, furioso, expulsa a filha, para sempre, e entrega metade do reino a cada uma das outras filhas. Mais tarde, as filhas más acabam por expulsar o pai, que caminha durante anos com o seu bobo fiel por terras desconhecidas. Já velho, cansado e cego, encontra, sem saber, o reino de sua filha Violeta. Esta serve-lhe um manjar de comida sem sal. O pai compreende, então, a falta de um bem tão essencial e pede perdão a Violeta por não ter percebido que ela era a única filha honesta e que realmente o amava.




Fontes de inspiração


Pelo menos, duas histórias terão servido  de inspiração ao texto dramático de Alice Vieira:


Um conto tradicional: 


O Sal e a Água


     Um rei tinha três filhas; perguntou a cada uma delas, por sua vez, qual era a mais sua amiga. 
     A mais velha respondeu:
     – Quero mais a meu pai do que à luz do Sol.
     Respondeu a do meio:
   – Gosto mais de meu pai do que de mim mesma.
     A mais moça respondeu:
     – Quero-lhe tanto como a comida quer o sal.
     O rei entendeu por isto que a filha mais nova o não amava tanto como as outras, e pô-la fora do palácio.
     Ela foi muito triste por esse mundo, e chegou ao palácio de um rei, e aí se ofereceu para ser cozinheira.
     Um dia veio à mesa um pastel muito bem feito, e o rei ao parti-lo achou dentro um anel muito pequeno, e de grande preço. Perguntou a todas as damas da corte de quem seria aquele anel. Todas quiseram ver se o anel lhes servia; foi passando, até que foi chamada a cozinheira, e só a ela é que o anel servia. O príncipe viu isto e ficou logo apaixonado por ela, pensando que era de família de nobreza.
     Começou então a espreitá-la, porque ela só cozinhava às escondidas, e viu-a vestida com trajos de princesa. Foi chamar o rei seu pai e ambos viram o caso.
     O rei deu licença ao filho para casar com ela, mas a menina tirou por condição que queria cozinhar pela sua mão o jantar do dia da boda.
     Para as festas do noivado convidou-se o rei que tinha três filhas, e que pusera fora de casa a mais nova. A princesa cozinhou o jantar, mas nos manjares que haviam de ser postos ao rei seu pai não botou sal de propósito.
     Todos comiam com vontade, mas só o rei convidado é que nada comia. Por fim perguntou-lhe o dono da casa porque é que o rei não comia.
     Respondeu ele, não sabendo que assistia ao casamento da filha:
     – É porque a comida não tem sal.
   O pai do noivo fingiu-se raivoso, e mandou que a cozinheira viesse ali dizer porque é que não tinha botado sal na comida.
     Veio então a menina vestida de princesa, mas assim que o pai a viu, conheceu-a logo, e confessou ali a sua culpa, por não ter percebido quanto era amado por sua filha, que lhe tinha dito que lhe queria tanto como a comida quer o sal, e que depois de sofrer tanto nunca se queixara da injustiça de seu pai.

Contos tradicionais portugueses do povo português,
recolha por Teófilo Braga, 1.ª ed. – Porto, 1860



Uma das mais famosas tragédias:

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